MP recomenda a anulação de pesquisa de mineradora Sigma em Araçuaí (MG)

Atingidos da Chapada do Lagoão (MG) lutam há meses contra a atuação da empresa Sigma, que pretende extrair 440 mil toneladas de lítio no território

Chapada do Lagoão possui mais de uma centena de nascentes catalogadas e é considerada a caixa d’água de Araçuaí (MG). Foto: MAB/MG

No último dia 03, o Ministério Público de Minas Gerais – MPMG, por meio de sua Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Social (CIMOS), recomendou ao Conselho da Área de Proteção Ambiental (APA) Chapada do Lagoão a anulação da votação que autorizou a pesquisa mineral de lítio na região.

O Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB já havia se manifestado contrário à pesquisa e denunciado a violação dos direitos de participação das comunidades do território no processo que autorizou a pesquisa.

Segundo o Movimento, “a violação de direitos se dá pela não realização de consulta prévia, livre, informada e de boa-fé das comunidades quilombolas Giral, Malhada Preta e Córrego do Narciso do Meio”. A consulta prévia é garantida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OTI), uma lei internacional que legisla sobre o direito de povos tradicionais no caso da atuação de empreendimentos em suas terras. Existem ainda outras comunidades que dependem econômica e culturalmente da Chapada, incluindo populações indígenas.

O Conselho da APA terá 10 dias para aceitar a decisão ou buscar justificativas para não seguir a recomendação. Para Lucas Martins, membro do Conselho e do Quilombo do Córrego do Narcizo, porém, “não há justificativa para a conivência com a realização de pesquisa para mineração na APA, considerando-se todos os impactos socioambientais da atividade”.

Articulação e resistência dos quilombolas

Em 23 de novembro de 2022, membros da comunidade quilombola Córrego do Narcizo acionaram o Conselho Regional de Direitos Humanos do Mucuri e realizaram uma reunião para denunciar as violações cometidas pelas empresas de mineração no território.

No último dia 01 de fevereiro, já havia acontecido uma reunião promovida pela Comissão de Comunidades Quilombolas do Vale do Jequitinhonha (COQUIVALE), que reuniu representantes do MAB, do Instituto Federal Norte de Minas – IFNMG, do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão Afro-brasileiros e Indígenas NEABI, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e do Ministério Público de Minas Gerais. Na ocasião foram denunciadas diversas violações de direitos praticadas por empresas da mineração no território. Os moradores também relataram o receio do aumento da violência, desmatamento de áreas nativas e redução da vazão das nascentes da região.

Após o encontro, a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT/MG) e o MAB encaminharam ao MPMG e ao Ministério Público Federal (MPF) a denúncia sobre a autorização concedida à Sigma.

No dia 17 de abril foi realizado um encontro entre o Ministério Público e movimentos sociais do Vale do Jequitinhonha, quando representantes do MAB entregaram uma carta apresentando a sua pauta ao procurador geral Jarbas Soares Júnior, solicitando a anulação da votação do Conselho.

Chapada do Lagoão território de Luta

A região da Chapada do Lagoão é marcada por anos de luta e resistência contra a monocultura do eucalipto e em defesa da vida do povo do campo e das matas nativas do Cerrado ali existente. Nos últimos quatro anos, houve muitas divergências dentro do Conselho da APA em relação a este debate.

A APA possui mais de 130 nascentes catalogadas e, por isso, é considerada a caixa d’água do município de Araçuaí. Ao todo, mais de 300 famílias vivem no território, incluindo comunidades tradicionais quilombolas.

Segundo comunicado da Sigma, a empresa pratica “mineração verde e sustentável”, mesmo pretendendo extrair lítio em Área de Proteção Ambiental. A CO-CEO da empresa, Ana Gardner, afirma que o complexo denominado Grota do Cirilo, que está sendo implantado em duas fases nos municípios de Itinga e Araçuaí, vai produzir 440 mil toneladas de concentrado de lítio grau bateria de alta pureza ao ano.

Essa atividade pode impactar diretamente no acesso à água dos moradores.
Enquanto as comunidades rurais do Vale do Jequitinhonha dispõem de uma caixa d’água de 16.000 litros para consumo doméstico por 8 meses (estiagem), ou seja, 2 mil litros por família/mês, a outorga da Agência Nacional das Águas – ANA para a Sigma na região de Itinga é de 3,8 milhões de litro/dia (100 milhões de litros mês), o que daria para abastecer 34.000 famílias.

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