Manobra jurídica pode dar maior garantia de acordo entre Vale e governo de Minas

Atingidos denunciam que mudar processo para 2ª instância favorece interesses da mineradora. Reunião aconteceu nesta quinta-feira (21)

Nesta quinta-feira (21), às 14h, no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ocorreu mais uma audiência sobre o acordo entre a Vale e o estado de Minas Gerais. A negociação é referente às consequências do rompimento da barragem de Córrego do Feijão, da Vale, em Brumadinho (MG). As rodadas ocorrem desde outubro de 2020, sem a participação dos atingidos pela barragem.

Manifestantes em frente ao TJMG. Crédito: Comunicação MAB

Além da mineradora e governo de Minas, participam da negociação a Defensoria Pública, o Ministério Público do estado e o Ministério Público Federal.

Processo muda da 1ª para 2ª instância

O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) vem acompanhando de perto todo o trâmite do acordo, realizando diferentes protestos à porta do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Os atingidos se dizem indignados com a falta de transparência do processo, que, indireta e diretamente, irá resvalar em suas reparações coletivas e individuais.

Desta vez, o movimento denuncia ainda a mudança do processo judicial de primeira para segunda instância, classificando-o como um “novo golpe” e “aberração jurídica”. Uma nota do movimento analisa que a mudança atende a interesses da mineradora Vale, que estaria buscando uma maior garantia de que o acordo será aceito e “encontra no Tribunal de Justiça de Minas Gerais melhores condições para prevalecer seus interesses”.

Os processos judiciais, que tramitavam em 1ª instância na 2ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte, conduzidos pelo juiz Elton Pupo Nogueira, foram transferidos para a 2ª instância, o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) do Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

Em nota, o Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM), denuncia que com a mudança de instância “o Tribunal de Justiça desrespeita o devido processo legal e usurpa a competência do Juiz Elton Pupo Nogueira, o juiz natural do processo, que é quem de fato deveria decidir sobre a homologação ou não do acordo da Vale S/A”.

Jurista comenta

O jurista José Geraldo de Souza Júnior diz que é preciso analisar os detalhes do motivo da mudança, mas desconfia de irregularidades, baseado no histórico deste e de outros processos. “Em geral, essa mudança de competência tende a representar uma politização da Justiça. Um estudo feito por Luciana Zaffalon mostra esse mecanismo, que sempre acaba blindando as elites e criminalizando os pobres”, argumenta.

Principalmente neste caso, conforme destaca o jurista, em que povos tradicionais, como comunidades rurais, indígenas, quilombolas, não estão tendo o direito de participarem do processo.

O livro de Luciana Zaffalon a que José Geraldo se refere é “A política da justiça: blindar as elites, criminalizar os pobres”.

Sem acordo

Mesmo com a continuação dos trâmites do acordo, as atingidas e atingidos realizaram um protesto à porta do Tribunal de Justiça, em BH, para denunciar a manobra no processo. O ato aconteceu na tarde do dia de hoje (21). As partes não chegaram a um acordo e nova audiência entre o governo estadual, a Vale e instituições de justiça deve ocorrer na próxima semana.

O movimento e parceiros fazem uma série de ações desde 8 de dezembro, para marcar os dois anos do rompimento da barragem de Córrego do Feijão, da Vale, em 25 de janeiro. No sábado (23), às 15h, acontece o Ato das Mulheres Atingidas em Defesa da Vida. Na segunda (25), o Dia de Memória pelas Vítimas, Luta por Direitos e Justiça. E no Dia 30 de janeiro, às 15h, o Ato Político Cultural da Água.

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